Curiosidades e histórias por trás da pintura espetacular que quase ficou de fora da coleção
Além de sua relevância histórica e filosófica, The Potato Eaters está envolta em uma série de histórias e fatos interessantes que a tornam ainda mais cativante para o público.
Os Modelos da Pintura
As pessoas retratadas na tela são membros da família camponesa De Groot. Van Gogh passou "horas com eles" na sua cabana, estudando a cena e as figuras com o objetivo de capturar a essência da vida familiar e do trabalho duro.
Estudos aos Montes
Passou meses praticando cabeças; o quadro foi precedido por dezenas de estudos preparatórios. Fez duas pinturas de estudo antes da versão final: na segunda, acrescentou a quinta pessoa e moveu o prato de batatas; a cena foi ficando mais elaborada.
Críticas na Época, Fama Depois
Ele ficou muito satisfeito com o resultado, mas o quadro recebeu críticas severas por ser escuro e "cheio de erros" — hoje é uma das suas obras mais famosas.
Mais Colorido do que Parece
Para chegar aos tons "acastanhados-acinzentados", ele usou teoria de "tons quebrados" (mistura de complementares), buscando um efeito colorido num quadro escuro.

O museu resume: Van Gogh usou as cores de uma batata sem descascar, "bem empoeirada"; muitos acharam o quadro escuro e estranho.
A casa às 19h, com detalhes escondidos — O relógio marca sete da noite; dá pra ver o vapor das batatas, uma estampa religiosa na parede, um tamanco com talheres perto da lareira e linguiças defumando; a assinatura em "Vincent" no encosto da cadeira escureceu e hoje mal aparece.
O Roubo Espetacular:
  • Data: O roubo ocorreu na madrugada de 14 de abril de 1991.
  • Local: Museu Van Gogh, Amsterdã.
  • Obras roubadas: Vinte pinturas importantes de Van Gogh, incluindo a versão final de "Os Comedores de Batata".
  • O "fracasso": Os ladrões planejaram a fuga, mas o carro de fuga sofreu um pneu furado perto da estação de trem Amsterdam Amstel. Forçados a abandonar o veículo, eles deixaram todas as obras de arte para trás.
Quatro holandeses foram presos meses depois pelo crime, embora as autoridades suspeitassem que agiam sob ordens de criminosos de escalões superiores, que nunca foram capturados.
Curiosamente, uma versão anterior de "Os Comedores de Batata" já havia sido roubada do Museu Kröller-Müller em 1988, mas também foi recuperada. https://en.wikipedia.org/wiki/The_Potato_Eaters#:~:text=Thieves%20stole%20the%20early%20version,robbery%2C%20the%20paintings%20were%20recovered.
Moradia com os Pais: Durante o período de criação da obra, Van Gogh morava com seus pais na pequena vila rural de Nuenen, na Holanda.
A Relação com Theo: Seu irmão mais novo, Theo, era a sua principal fonte de apoio financeiro e emocional. As longas cartas que trocavam são a principal fonte de informação sobre seus pensamentos e processos criativos.
Uma Experiência Imersiva no Museu: O Van Gogh Museum prestou uma homenagem única à pintura com a exposição que destacou o trabalho. Para a ocasião, uma "reconstrução em tamanho real" da cabana da família De Groot foi criada, permitindo que os visitantes entrassem e "se sentassem à mesa do jantar" para vivenciar a cena de perto.
Tour virtual da exposição (no final tem a reconstituição em tamanho real da sala de jantar)https://youtu.be/1DMU4D1xf0c

Entre a ambição e a crítica
A obra The Potato Eaters, pintada por Vincent van Gogh em 1885, representa um momento crucial e paradoxal em sua carreira artística. Criada em Nuenen, nos Países Baixos, enquanto o artista residia com seus pais, esta pintura é frequentemente citada como um dos primeiros trabalhos importantes de Van Gogh. Ela não é apenas uma representação da vida camponesa, mas uma declaração filosófica e uma ambiciosa tentativa do artista de se provar no cenário da arte europeia. Apesar de ter sido considerada por ele mesmo como "a melhor coisa que ele já tinha feito", a obra foi recebida com considerável crítica na época, especialmente por seu uso de cores escuras e a aparente falta de perfeição técnica.
Essa dicotomia entre a convicção pessoal de Van Gogh e a recepção inicial de sua obra-prima é um tema central para sua compreensão. A tensão entre a ambição do artista e a crítica de seus pares não é meramente uma nota de rodapé histórica, mas a própria essência da história por trás da pintura. Uma exposição no Van Gogh Museum, intitulada "The Potato Eaters. Mistake or Masterpiece?" (Erro ou Obra-Prima?), capitalizou diretamente nessa narrativa, enquadrando a história da pintura como uma jornada de "ambição, perseverança e crítica". Essa abordagem destaca como o valor de uma obra de arte pode ser reavaliado drasticamente ao longo do tempo, e como um "fracasso" inicial pode ser um prelúdio para um sucesso duradouro. Nesta página vamos desvendar a história completa por trás dessa obra controversa, explorando a filosofia que a inspirou, o rigoroso processo de sua criação e os fatos curiosos que a tornam uma das pinturas mais emblemáticas do mundo.
A filosofia da autenticidade: O sentido por trás das cores e das formas
Peça de Demonstração
Van Gogh concebeu a pintura como um projeto ambicioso destinado a provar que ele estava no caminho certo para se tornar um "bom pintor de figuras". Esta intenção estabelece uma meta técnica clara por trás da obra.
Realismo Cru
O artista não estava interessado em retratar uma cena de idealizada beleza rural, mas sim a "dura realidade da vida no campo". Ele buscava transmitir uma mensagem poderosa e autêntica sobre a dignidade do trabalho manual.
Autenticidade Visceral
Van Gogh defendia que uma pintura camponesa deveria "cheirar a bacon, fumaça, vapor de batata" e que isso não era "pouco saudável". Sua preferência por essa autenticidade visceral em detrimento de uma beleza idealizada é evidente.
Sua escolha de retratar os camponeses da família De Groot com "rostos grosseiros e mãos ósseas e trabalhadoras" serviu a um propósito específico: mostrar que "eles mesmos lavraram a terra com estas mãos que estão a colocar no prato", evidenciando que haviam "honestamente ganhado a sua comida".
A estética da pintura é uma extensão direta dessa filosofia. Van Gogh escolheu conscientemente uma paleta de cores terrosas, que ele descreveu poeticamente como "algo como a cor de uma batata realmente empoeirada, sem descascar, é claro".
A decisão de Van Gogh de priorizar a "mensagem da pintura" em vez da "anatomia correta ou perfeição técnica" não deve ser interpretada como um erro de principiante, mas sim como um ato consciente de rebelião filosófica. Ele estava desafiando as convenções artísticas de sua época, que frequentemente valorizavam a representação idealizada. Essa escolha deliberada de abraçar o imperfeito e o real é o que, ironicamente, fez a obra resistir ao teste do tempo. O contraste entre sua busca por perfeição técnica, ao tentar se tornar um "bom pintor de figuras", e sua escolha consciente de romper com essa perfeição em nome da autenticidade, cria uma fascinante tensão interna na obra, revelando a complexidade do seu pensamento e a sua determinação em forjar um estilo genuinamente pessoal.
Do estudo ao toque final: A jornada de criação de uma obra-prima
Preparação Exaustiva
Van Gogh criou cerca de 50 estudos de "cabeças" em preparação para a obra. Esse trabalho preparatório revela sua dedicação inabalável e seu esforço para dominar a representação da forma humana.
Múltiplas Versões
A versão final é a pintura a óleo sobre tela no Van Gogh Museum em Amsterdã. Existe também um esboço a óleo original no Kröller-Müller Museum em Otterlo, além de uma litografia criada "a partir da memória" em um único dia.
Defesa Veemente
Após críticas de seu irmão Theo e amigos, Van Gogh defendeu seu trabalho com veemência, respondendo: "você... não tinha o direito de condenar o meu trabalho da maneira que fez".
Filosofia Artística
Sua determinação culminou em uma das frases mais emblemáticas de sua filosofia: "Eu estou sempre a fazer o que ainda não consigo fazer para aprender a fazê-lo".
A criação de The Potato Eaters foi um processo meticuloso e árduo que revela a dedicação inabalável de Van Gogh. Longe de ser um momento de inspiração espontânea, a pintura foi o resultado de um trabalho preparatório exaustivo. A existência dessas diferentes versões demonstra a persistência do artista em aperfeiçoar sua visão, enquanto a criação da litografia de memória mostra o seu domínio mental sobre a composição.
A narrativa da obra, portanto, é a história da persistência de um artista. Os 50 estudos de cabeças são a prova de um esforço monumental para dominar uma habilidade que ele sentia que ainda não possuía. Sua resposta à crítica demonstra sua imensa crença na sua própria visão, a despeito do julgamento negativo. A obra é um documento do processo criativo, da disciplina e da convicção inabalável de Van Gogh.
Conclusão: Um olhar para o futuro, ancorado no passado
A trajetória de The Potato Eaters é uma poderosa parábola sobre a evolução de uma obra de arte. De uma controversa "peça de demonstração" rejeitada por seus pares, ela se transformou em um ícone da arte moderna. O legado da pintura reside não apenas em sua execução, mas também no testemunho que ela oferece sobre a visão de Van Gogh a respeito da arte e da vida. Sua determinação em defender sua visão, sua crença na autenticidade e sua perseverança diante da crítica se tornaram tão emblemáticas quanto suas pinceladas expressivas.
The Potato Eaters continua a ressoar com o público porque nos convida a ver a beleza e a dignidade na realidade simples e honesta. A pintura é um lembrete de que o valor de uma obra de arte não é determinado pela perfeição técnica, mas pela profundidade de sua mensagem e pela sinceridade de seu propósito.
A jornada da obra, de um projeto ambicioso a um clássico atemporal, reafirma a ideia de que a verdadeira grandeza muitas vezes reside na coragem de ser autêntico.
Cartas sobre a obra
Ler as cartas de Van Gogh é melhor que qualquer biografia, ele escreveu centenas de cartas que estão catalogadas em https://vangoghletters.org/vg/letters.html
Tem várias que falam sobre The Potato Eaters, só na 492 já tem muita coisa fantástica, não é possível que uma pessoa que conheça essa história não queira ter uma roupa com "os comedores de batata" estampado.
Veja a transcrição traduzida de duas cartas espetaculares nas quais ele se refere a obra:

Carta 492 - De: Vincent van Gogh - Para: Theo van Gogh - Data: Nuenen, quinta-feira, 9 de abril de 1885

Meu caro Theo, Fiquei um pouco surpreso por não ter recebido nem uma única palavra sua. Você dirá que tem estado ocupado demais para pensar nisso — e eu entendo muito bem isso. Já é tarde — mas eu queria dizer mais uma vez que espero de todo o coração que de agora em diante a correspondência volte a ser mais animada do que tem sido ultimamente. Aqui estão dois arranhões depois de alguns estudos que fiz, 1 enquanto ao mesmo tempo estou trabalhando novamente naqueles camponeses ao redor de um prato de batatas. Acabei de voltar de lá — e continuei trabalhando nisso à luz de uma lâmpada — embora, dessa vez, tenha começado à luz do dia. Veja, é isso que a composição se tornou agora. Eu a pintei em uma tela bem grande e, do jeito que o Mas sei com certeza que CM , por exemplo, falaria de — mal desenhado etc. Você sabe o que pode ser dito definitivamente para contradizer isso? Que os belos efeitos da luz na natureza exigem um trabalho muito rápido. Agora, eu sei muito bem que os grandes mestres eram capazes tanto de finalizar quanto de manter a vitalidade, particularmente no período de sua experiência madura. Mas isso é algo que certamente não poderei fazer por enquanto. No momento em que estou, porém, vejo uma chance de dar uma impressão concreta do que vejo. Nem sempre literalmente exatamente — na verdade, nunca exatamente — pois vemos a natureza através do nosso próprio temperamento. 3 O que eu gostaria de aconselhar agora é o seguinte: não deixe o tempo passar — ​​deixe-me trabalhar o máximo possível — e guarde todos os estudos de agora em diante. Prefiro não assinar nenhum deles ainda, porque não gostaria que circulassem como pinturas, para que alguém tivesse que comprá-los de volta mais tarde, caso se tornasse famoso. Mas é bom que você esteja mostrando, porque você verá que um dia a gente vai encontrar alguém que queira fazer o que eu estou te sugerindo, ou seja, fazer uma coletânea de estudos. Pretendo sair regularmente de manhã e encarar o que vejo as pessoas fazendo no campo ou em casa. Como faço agora, pelo menos. Você está procurando novas ideias para o comércio de arte; a ideia de ser justo com os amantes da arte não é nova, mas é uma que nunca envelhece . Assim como dar segurança — em uma compra. E eu lhe pergunto, um amante da arte não está melhor quando ele tem, digamos, 20 esboços muito diversos de um pintor pelo mesmo preço que ele razoavelmente teria que pagar por uma pintura que foi finalizada para que pudesse ser colocada em circulação como uma mercadoria vendável? Se eu estivesse em sua posição, porque afinal você conhece muitos pintores jovens que ainda não fizeram um nome, eu apenas tentaria uma vez colocar estudos pintados no mercado propriamente dito — não como pinturas, mas montados de uma forma ou de outra, em Bristol dourado, digamos, ou preto ou vermelho escuro. Mas eu falei lá sobre dar segurança . Nem todos os pintores fazem muitos estudos — mas muitos o fazem, e os mais jovens, em particular, precisam fazer isso o máximo possível, não é mesmo? Qualquer pessoa que possua um estudo de pintura pode ter quase certeza (pelo menos é o que me parece) de que existe um vínculo entre o pintor e ele que não pode ser facilmente quebrado por um capricho. Há pessoas, não é mesmo, que apoiam os pintores quando eles ainda não estão ganhando — muito bem. Mas com que frequência acontece que algo assim termine mal — de forma desagradável para ambas as partes? Por um lado, porque o patrono está insatisfeito com o dinheiro totalmente desperdiçado, ou pelo menos parece ser. Por outro, porque o pintor se sente no direito de exigir mais confiança, mais paciência e interesse do que as pessoas estão dispostas a dar. Mas, na maioria dos casos, é o descuido de ambas as partes que dá origem aos mal-entendidos. Espero que não seja o caso entre nós. E espero que, gradualmente, meus estudos lhe deem uma nova coragem. Nem você nem eu somos contemporâneos daquela geração que Gigoux corretamente chama de "os valentes" naquele seu livro que li. Mas manter o entusiasmo daqueles dias nesta época é, no entanto, aconselhável, parece-me, porque muitas vezes é verdade que a sorte favorece os ousados, 5 e seja como for — sobre a fortuna ou 'la joie (?) de vivre', 6 isto é — é preciso trabalhar e ser ousado se realmente se quer viver. E eu digo, vamos pintar muito e ser produtivos, e ser nós mesmos com defeitos e qualidades — digo nós — porque o dinheiro que você me dá, que eu sei que lhe causa problemas o suficiente para me sustentar, lhe dá o direito, se algo de bom acontecer no meu trabalho, de considerar metade dele como sua própria criação. Tente falar com alguém no Le Chat Noir 7 e pergunte se ele quer um pedaço desses comedores de batata e, se sim, qual o tamanho, porque para mim não faz diferença. Atenciosamente, com um aperto de mão. Sinceramente, Vincent https://vangoghletters.org/vg/letters/let492/letter.html

Carta 528 - De: Vincent van Gogh - Para: Anthon van Rappard - Data: Nuenen, por volta de terça-feira, 18 de agosto de 1885

Meu caro amigo Rappard , Acabei de receber sua carta e o croqui de sua pintura. 1 É certamente um bom tema, e não tenho nada contra a composição em relação ao equilíbrio. Posso dizer uma coisa — que eu não diria se a pintura estivesse terminada e, consequentemente, difícil de alterar — que eu digo , já que certas mudanças que não dizem respeito às linhas poderiam ser feitas com vantagem? Veja — a figura no meio da pintura — a mulher com o ancinho. Boa em seu lugar, mas — varrer o quintal é uma ação que é um detalhe muito pequeno para uma figura central realizar, me parece. Por essa razão, de minha parte, prefiro ver a figura no meio — em primeiro plano — carregando tijolos (sendo esta uma ação muito expressiva e característica aqui, explicada por toda a obra). Eu preferiria colocar o ancinho nas mãos da figura no meio do plano (que agora está carregando tijolos (e ocupa um lugar secundário na composição)). Isso é possível? Em relação ao andamento da obra? Se não, pense se quiser sobre a questão, pois me parece que não é sem importância, e comentários poderiam ser feitos a respeito. O fato de a figura estar em pé ali é bom , mas, sem alterar as linhas, não há uma ação mais interessante que você possa imaginar? Não me leve a mal, por favor. Não acho que possa fazer mal nenhum propor coisas como essa para consideração quando uma pintura está sendo planejada. Não acho que isso seja impor minhas ideias à força. Tornar as ações expressivas é uma questão extremamente importante, na minha opinião, principalmente se a pintura for de grande formato. Sei que isso é pedir muito , sei que as linhas e o equilíbrio das linhas podem ditar a lei aqui. Mas essas linhas podem muito bem permanecer belas e tranquilas. De qualquer forma — acredito que talvez eu não esteja errado nesse aspecto — e é sobre sua figura central — então não ousei dizer qual foi minha impressão. Se não for pedir muito, gostaria de sugerir que um dos carregadores de tijolos se abaixasse e colocasse os tijolos no chão, para que os dois não fizessem a mesma coisa. Mas dá no mesmo, já que haveria duas figuras curvadas . E, afinal, isso não importa tanto. Mas o primeiro comentário é, na verdade, o que sinto acima de tudo. Quanto ao meu trabalho, a coisa com aqueles comedores de batata cuja litografia você viu é um assunto que tentei pintar, levado pela iluminação singular da casa de campo sombria. 3 Está em um espectro tão baixo que as cores claras , espalhadas em papel branco, digamos, pareceriam manchas de tinta — elas aparecem como luzes na tela por causa das fortes forças que se opõem a elas, por exemplo, o azul da Prússia aplicado exatamente como está, sem se misturar. Minha própria crítica é que, ao prestar atenção nisso, perdi de vista a forma dos torsos . Cabeças e mãos foram feitas com muito cuidado, no entanto, e — como estas eram as mais importantes e o resto quase inteiramente escuro (tão realmente muito diferente em efeito da litografia), talvez seja mais desculpável da minha parte do que você pensa tê-lo pintado como fiz. E, além disso, o desenho na pintura real também é diferente do esboço que ainda tenho dele 4 e que fiz na casa de campo à noite à luz de uma pequena lâmpada, ou da litografia. Queria também dizer que, desde que você esteve aqui, pintei um número considerável de cabeças e desenhei muitas figuras de camponeses, escavadores, capinadores e ceifeiros. Que em tudo isso, direta ou indiretamente, a grande questão me ocupava — a cor. Refiro-me à quebra das cores, vermelho com verde, azul com laranja, amarelo com violeta. Sempre como as cores complementares se combinam, sua influência umas sobre as outras. Da qual a natureza é tão plena quanto de luz e sombra. Outra questão — com a qual me absorvo todos os dias — é precisamente aquela que você — injustamente, creio — afirmou que eu negligencio: a representação da modelagem da forma, suas linhas e massas principais, onde se pensa no contorno em último lugar, e não em primeiro . Veja aqui alguns croquis de pequenas composições — ambos pintados por mim. Ultimamente, tenho trabalhado principalmente em um formato bastante pequeno . À medida que continuo a concentrar minha atenção especificamente nos camponeses , a paisagem é algo com que estou envolvido todos os dias. Eu tinha acabado de pintar algumas casas quando Wenckebach veio me ver. Não tenho literalmente nada de novo em relação a xilogravuras, além de — 4 grandes composições de Lhermitte . 7 Para mim, esse homem é MILLET II no sentido pleno da palavra; idolatro sua obra, assim como a do próprio Millet. Considero seu gênio comparável ao de Millet I. Meu irmão esteve aqui recentemente e me contou várias coisas sobre o que está acontecendo em Paris que considero muito encorajadoras. O sucesso da exposição de Eugène Delacroix . 8 Depois, fiquei interessado no que ele me contou sobre Raffaëlli , um pintor de figuras, e Claude Monet , um pintor de paisagens colorista . 9 De resto, você mesmo perceberá — não é tanto uma era de ouro quanto uma era de ferro para os pintores — quero dizer, não é exatamente fácil sequer sobreviver. Pelo menos para mim, é pura miséria — só que, apesar de tudo isso, minha coragem e talvez meus poderes também são maiores, e não menores, do que antes. Não pense que você é o único que pensa ou pensou — como você vai — que teve que me criticar até a destruição total — pelo contrário, é praticamente a única coisa que experimentei até agora. Precisamente porque você não é ou não foi o único que fala exclusivamente assim, sua crítica se relaciona com outras críticas, às quais, de minha parte, rebato com a convicção de ter uma razão de ser para meus esforços — e — continuarei rebatendo cada vez mais. A razão pela qual eu — embora não tenha insistido no meu jeito, mas deixado você fazer o seu — a razão pela qual comecei pedindo que você considerasse — a retratação completa da sua crítica, não foi que eu quisesse despoticamente dobrar ou quebrar suas opiniões. Essa não era a minha intenção, de forma alguma, embora tenha sido assim que você entendeu. Aqui estão alguns detalhes perfeitamente corretos. Eu te desabafei sobre desenhar modelos de gesso, e até confesso francamente que seria capaz de fazer isso de novo. 10 E sobre outras questões — nem sempre consigo ficar sentado em silêncio; às vezes me parece que as pessoas estão me tocando fisicamente, tão preso à questão às vezes me sinto e minha convicção às vezes é parte de mim mesmo. É verdade que há definitivamente falhas na litografia e em muitos outros trabalhos também. Mas em outros trabalhos eu provo com muita clareza o que busco, para que as pessoas se justifiquem ou ajam de boa-fé quando agem de outra forma que não seja julgar a obra como um todo e de forma mais ampla — levando em conta o objetivo e o esforço — ou seja, pintar camponeses em seu ambiente — o camponês em casa. 11 Agora você chama toda essa minha obra de extremamente fraca e demonstra longamente que os defeitos superam as qualidades. Assim sobre meu trabalho, assim sobre minha pessoa. Bem, agora, eu não aceito isso, definitivamente não . O trabalho em questão, pintar os camponeses, é tão trabalhoso que os extremamente fracos jamais se aventurariam nele. E eu, pelo menos, me lancei nele e lancei certas bases, o que não é exatamente a parte mais fácil do trabalho! E adquiri algumas noções sólidas e úteis de desenho e pintura, com mais firmeza do que você pensa, meu caro amigo. Mas continuo fazendo o que ainda não consigo fazer para aprender a fazê-lo. Mas é um tédio para mim e para você escrever sobre isso. Termino dizendo que o trabalho é árduo e que seria sensato que os pintores camponeses e o povo se unissem o máximo possível, em vez de brigar. A união faz a força, e não devemos lutar uns contra os outros, mas contra aqueles que, mesmo agora, neste período, impedem o progresso das ideias pelas quais Millet e outros de uma geração anterior lutaram e foram pioneiros. Nada é mais obstrutivo do que essa briga fatal entre nós. E quanto a você e a mim, que isso acabe, pois nosso objetivo é o mesmo. Mas minha razão era precisamente que o seu esforço e o meu, embora não sejam os mesmos , correm paralelos , em vez de diametralmente opostos. E embora, como direção e em princípio, haja pontos de concordância suficientes e, creio, continuarão a haver, ocorreu-me que a sua crítica, como um todo, era inconsistente, em sua aplicação a mim , com o caráter da sua própria obra. Temos em comum o fato de buscarmos nossos temas no coração das pessoas, e também a necessidade — seja como objetivo , seja como meio — de extrair nossos estudos da realidade. E isso é ter muito em comum. E, no fundo , quanto a sermos opostos em relação à técnica de desenho ou à técnica de pintura, eu, de minha parte, não estou convencido disso. Você está à minha frente em muitas coisas, não nego, mas ainda acredito que foi longe demais. Mas seja como for, o que considero desejável é que, se quisermos e tentarmos, talvez possamos ser úteis e dar apoio uns aos outros, e porque a união faz a força, devemos permanecer amigos. Quanto à técnica, ainda estou em busca de muitas coisas e, comigo, acontece que, embora encontre algumas, ainda me faltam infinitas. Mas, mesmo assim, sei por que trabalho como trabalho e baseio minha busca em terreno sólido. Eu disse a Wenckebach recentemente que não conhecia um pintor que tivesse tantos defeitos quanto eu — mas isso não me convenceu de que eu estivesse radicalmente errado. Comigo, às vezes, é uma questão de: dois negativos formando um positivo . Pegue qualquer estudo ou desenho meu que você goste, mesmo aquele que eu mesmo lhe apontaria com relativa serenidade. E — haverá erros tanto no desenho quanto na cor ou tom que um realista não cometeria facilmente . Certas imprecisões das quais eu mesmo estou convencido, que, se necessário, eu mesmo às vezes apontarei com mais severidade do que outras pessoas. Imprecisões às vezes, ou imperfeições. E, no entanto, acredito que — mesmo que eu continue produzindo um trabalho no qual as pessoas, se quiserem analisá-lo precisamente desse ângulo e com esse objetivo, possam encontrar falhas — ele terá uma certa vida própria e uma razão de ser que superará essas falhas — aos olhos daqueles que apreciam o caráter e refletem sobre as coisas em suas mentes . E com todos os meus defeitos, as pessoas não acharão tão fácil me oprimir quanto pensam. Sei muito bem qual é o meu objetivo, estou absolutamente e completamente convencido de que estou, afinal, no caminho certo — quando quero pintar o que sinto e sentir o que pinto — para me preocupar demais com o que as pessoas dizem de mim. Mesmo assim, às vezes isso torna a vida muito difícil para mim e — considero muito possível que algumas pessoas se arrependam mais tarde das coisas que disseram sobre mim, ou da oposição ou indiferença com que me atormentaram. O que faço em resposta é me retrair tanto que literalmente não vejo ninguém além — os camponeses — com quem estou diretamente envolvido para pintá-los. E esse continuará sendo meu sistema, e pode até ser que em breve eu desista do meu estúdio e vá morar em uma casa de campo, para não mais ouvir ou ver nada daqueles que se dizem pessoas civilizadas. Quando digo que quero continuar amigo, e falo sério, é porque vejo em você um esforço que admiro muito. Você se aprofunda nas pessoas e tem a força de vontade para levar isso adiante. Quando digo que talvez possamos ser úteis e nos apoiar mutuamente, então eu digo. porque, caso você não se submeta a convenções, provavelmente, à medida que se tornar mais conhecido, fará coisas ainda mais ousadas , e então poderá haver um choque positivo entre pinturas de uma escola e de outra. E, nessas circunstâncias, pode ser bom que vários pintores atuem em uníssono. De outro ângulo, não acho inútil compartilhar ideias e ver o trabalho uns dos outros. Aqui está um terceiro pequeno rascunho de um estudo que fiz ontem. 12 Atenciosamente — Sinto-me na obrigação de oferecer o comentário sobre a ação da mulher no meio da sua composição para sua consideração; quanto ao resto, considero a composição muito sensata e todo o design simpático. Quando vir Wenckebach , por favor, envie-lhe meus cumprimentos. Sinceramente, Vincent Você pode ver no meu croqui que, da minha parte, eu me esforço muito especificamente para colocar ação — estar ocupado — fazer alguma coisa — nas minhas figuras. Acho bom que uma figura na sua composição, de qualquer forma, já esteja curvada — estar em processo de trabalho talvez seja algo que muitas linhas verticais na composição tornariam mais difícil de expressar. https://vangoghletters.org/vg/letters/let528/letter.html

Pequenos trechos e os links de outras cartas falando sobre a obra
1
#492 — Nuenen, 9 Apr 1885
"I'm working on those peasants around a dish of potatoes again." (Ele anuncia o tema e envia croquis.) (Cartas de Van Gogh)
2
#493 — Nuenen, 13 Apr 1885
"I enclose herewith a scratch, more precise than the one before, after my latest study." (Novo croqui, mais preciso, do estudo dos comedores.) (Cartas de Van Gogh)
3
#496 — Nuenen, ~28 Apr 1885
"...the current state of the potato eaters... I'm hard at work on it." (Ele diz que está trabalhando intensamente na tela.) (Cartas de Van Gogh)
4
#497 — Nuenen, 30 Apr 1885
"I would like to have sent you the painting of the potato eaters… it's not quite finished yet." (Queria enviar no aniversário do Theo, mas ainda não estava pronta.) (Cartas de Van Gogh)
5
#499 — Nuenen, ~2 May 1885
"The drab linen tablecloth… prove to be very dark grey in the light of the lamp." (Descreve a paleta "baixa" e o interior cinzento à luz da lamparina.) (Cartas de Van Gogh)
6
#500 — Nuenen, 4–5 May 1885
"...it has rusticity and a certain life in it." (Defende a tela e explica por que a envia "com certa confiança".) (Cartas de Van Gogh)
7
#501 — Nuenen, 6 May 1885
"today, Wednesday, a crate marked V1, free domicile, containing the painting." (Confirma o envio da pintura + estudos.) (Cartas de Van Gogh)
8
#528 — Nuenen, ~18 Aug 1885
(a Rappard) "As regards my work, the thing with those potato eaters… is a subject that I tried to paint." (Comenta a litografia e a luz "singular" da choupana.) (Cartas de Van Gogh)
9
#532 — Nuenen, ~25–29 Sep 1885
"The fact that the colour isn't right in the painting of the potato eaters is at least in part the fault of the paint." (Auto-crítica cromática meses depois.) (Cartas de Van Gogh)
Tabela de resumo: Fatos essenciais sobre The Potato Eaters
A tabela a seguir consolida os principais dados técnicos e históricos da obra, oferecendo um guia de referência rápido para os leitores. A inclusão de informações sobre as diferentes versões da obra é particularmente relevante para um público leigo, que pode não estar ciente da sua existência.